O Papel das Mulheres... nos conflitos bélicos
e no Estado Novo
Donas-de-casa, esposas, mães, educadoras: eis
os principais papéis reservados ao longo dos séculos pelas sociedades europeias
às mulheres. Afastadas, por regra, das decisões políticas, e, por via disso,
dos assuntos bélicos, nem por isso deixaram de, na retaguarda, sofrer na carne
—ou na carne dos seus— os efeitos dos conflitos militares, e de, por outro
lado, contribuir para o "esforço de guerra". Este apoio foi crescente
de conflito para conflito, ao longo do século XX.
As mulheres assumiram novas responsabilidades e
passaram a ocupar os lugares deixados vagos pelos homens na actividade
económica. A 1ª Guerra Mundial contribuiu, de um modo decisivo, para o triunfo
dos ideais feministas. A mobilização de exércitos de milhões de homens produziu uma fatal e inevitável
rarefação em todas as actividades económicas: na agricultura, na indústria, no
comércio e nas profissões liberais. Além disso, as necessidades da defesa
militar impunham, aos países envolvidos no conflito, a produção maciça e acelerada
do material de guerra, e, desta maneira, a mulher aparece a substituir o homem
em toda a parte: nas fábricas de munições e de armamento, nos hospitais e nas
repartições públicas, nos escritórios e nas oficinas; ora guiando automóveis,
ora conduzindo elétricos.
Em Portugal, a retórica salazarista
apresentava a família como a célula central na dinâmica da nova sociedade que
se pretendia construir e consolidar, prevalecendo
a autoridade masculina, pois o marido permanecia «chefe da família», com
poderes decisórios relativamente a todos os atos da vida conjugal. “Uma mulher casada não podia ir para o
estrangeiro sem autorização do marido, não podia trabalhar sem
autorização do marido. O marido podia chegar a uma empresa ou estabelecimento
público e dizer: eu não autorizo a minha esposa a trabalhar. E ela tinha que
vir embora, tinha que ser despedida”.
Quanto
à mulher, era responsabilizada pelo governo doméstico mesmo se trabalhasse fora do lar. A administração dos bens do
casal continuava a caber ao marido e a mulher continuava
obrigada a adotar a residência do marido e a estar impossibilitada de sair do
país,
exercer comércio, ou movimentar
depósitos bancários, sem o consentimento dele.
Assim, as mulheres eram vistas como suas subalternas, um traço
que o Estado Novo reforçava cada vez mais. Salazar não se cansava de dizer que
o lugar da mulher era em casa.
Maria
Lamas descreveu muito bem a situação do trabalho feminino:
«No
povo não há, praticamente, mulheres domésticas. Todas trabalham, mais ou menos
fora do lar. Quando não são
operárias, são trabalhadoras rurais, vendedeiras, criadas de servir ou
“mulheres-a-dias”. (….) Seria quase impossível mencionar todas as
suas ocupações que vão do roçar mato aos mais delicados bordados, sem contar com as grandes indústrias
em que ela ocupa lugar predominante».
E, por isso, impôs restrições e impedimentos vários ao trabalho
feminino…
… As professoras primárias para contraírem
matrimónio - a partir de 1936 - tinham de solicitar autorização ao Ministério
da Educação Nacional, comprovando o “bom
comportamento moral e civil” do pretendente e “os
vencimentos ou rendimentos, (…), em harmonia com
os vencimentos da professora."
A proibição do casamento foi também imposta às telefonistas da
Anglo-Portuguese Telephone Company (permitido em 1940), às enfermeiras dos
Hospitais Civis (autorizado em março de 1963), às profissionais do Ministério dos
Negócios Estrangeiros e às hospedeiras de ar da TAP (em vigor até ao 25 de
abril de 1974). E era também proibido às mulheres o acesso a cargos na
administração local, na carreira diplomática,
na magistratura judicial e em postos de trabalho no Ministério das Obras
Públicas (até 1962).
A
década de 60 é aquela em que as mulheres acedem, maciçamente, ao trabalho
industrial e dos serviços, em
muitos casos para substituir a mão-de-obra masculina que se ausenta para o estrangeiro e para África.
A partir de 1967, o novo Código Civil eliminou a
necessidade de a mulher pedir o consentimento
do marido para exercer profissões liberais ou funções públicas, publicar obras
ou
ter actividades lucrativas.
Mª
Eugénia Pinho
Sem comentários:
Enviar um comentário